Jogos de tabuleiro no Brasil
13.11.2021
5min de leitura
Uma breve história de dados, tabuleiros e meeples
O DESENVOLVIMENTO DO HOBBY, SEUS DESAFIOS E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO MERCADO BRASILEIRO
A história dos jogos de tabuleiro no Brasil não é muito antiga, mas apesar de sua brevidade é cheia de ação, empreendedores ousados e grandes doses de criatividade.
Venha com a gente explorar um pouco dessa trajetória.
Um novo hábito
Jogos de mesa antigos, como Banco Imobiliário, Jogo da Vida e War, são populares no Brasil desde meados da década de 1970. Naquele momento, o alcance do hobby era limitado a uma pequena classe média devido a grande desigualdade social, as severas crises econômicas e ao elevado grau de analfabetismo.
No começo dos anos 2000 a economia brasileira se consolidou e houve um significativo aumento na qualidade de vida média do brasileiro. Essa nova realidade trouxe novos hábitos de consumo para a população que passou a gastar mais dinheiro em entretenimento. Filmes, TV a cabo, livros e jogos passaram a fazer parte da vida de uma parcela maior da população.
Jogos famosos como Catan e Carcassonne foram lançados neste período, mas no geral eram vistos como uma curiosidade nas lojas de quadrinhos. Jogos de tabuleiro recentes eram uma raridade, podendo ser vistos na casa de um amigo ou familiar que tivesse viajado para o exterior.
As coisas mudaram profundamente a partir de 2013, quando Zombicide, o clássico jogo de matar zumbis, chegou ao mercado nacional e se tornou um grande sucesso. A popularidade do tema, as miniaturas e uma taxa de câmbio favorável criaram um verdadeiro best seller. Para muitos jogadores, lojistas e empresários esse foi um marco para o mercado brasileiro de jogos de tabuleiro.
Em busca dos jogos famosos
Nos anos seguintes uma série de editoras, fábricas de componentes e lojas especializadas foram fundadas. Eventos como o Board Games São Paulo e o Diversão Offline atraíram milhares de pessoas e houve o surgimento de uma mídia especializada em acompanhar os lançamentos e analisar as tendências de mercado.
Na segunda metade da década de 2010 os jogadores brasileiros recebiam lançamentos internacionais como Azul, Terraforming Mars e Clãs da Caledônia de maneira quase simultânea. O público nacional se acostumou a ter em suas mesas produtos de alta qualidade.
Por conta desse padrão de exigência, as editoras brasileiras passaram a buscar incessantemente parcerias com empresas da Europa e dos EUA. O objetivo era garantir jogos famosos, com qualidade internacional comprovada e que combinassem alta competitividade com baixo risco.
Competindo com os grandes
Os game designers brasileiros tinham de competir contra grandes títulos pela atenção de jogadores e editoras. Essa situação era um tanto injusta, pois os designers europeus e estadunidenses tiveram ao menos duas décadas de experiência para poder refinar e melhorar a sua produção.
Até pouco tempo atrás o preconceito em relação aos jogos brasileiros era bastante comum. A insistência foi fundamental para que os jogos vissem a luz e começassem a romper essa barreira: campanhas de financiamento coletivo, edições pequenas e muito trabalho ajudaram a fortalecer a imagem dos jogos brasileiros dentro do país.
Atualmente o mercado nacional reconhece o talento e a criatividade dos profissionais envolvidos na indústria de jogos brasileira. E esse reconhecimento está indo muito além das fronteiras nacionais: Cartógrafos, Paper Dungeons e Brazil: Imperial são apenas alguns exemplos de jogos que têm feito grande sucesso por todo o mundo.
O impacto da pandemia
A Covid-19 e suas consequências são um desafio para todos.
Muitos jogadores que costumavam praticar o hobby em eventos regulares ou com grupos de amigos tiveram de modificar seus hábitos. Jogar sozinho ou com um parceiro era uma coisa nova para muita gente, mas parece que esse tipo de jogatina caiu no gosto das pessoas. Foi notório o aumento de interesse, e por conseguinte das vendas, de jogos com modo solo ou para dois jogadores.
As lojas tiveram de lidar com um problema imenso, Muitas lojas não são apenas pontos de venda, mas sim espaços importantes onde as pessoas se encontram para jogar e consumir bebidas e alimentos. As restrições da pandemia interromperam o atendimento presencial e dificultaram bastante as coisas. Pequenas empresas fora dos grandes centros não estavam preparadas para operar apenas com vendas online. Infelizmente, muitas dessas lojas não sobreviveram a esse novo cenário.
A pandemia ampliou significativamente os problemas estruturais da economia brasileira e isso criou um pesadelo para as editoras. Desvalorização do real perante o dólar, problemas nas fábricas chinesas e uma crise sem precedentes envolvendo a falta de contêineres impactaram profundamente uma indústria dependente de importações.
Essas mudanças levaram as editoras brasileiras a ampliarem seus esforços para criarem novas oportunidades e alternativas. Nos últimos dois anos mais jogos nacionais foram lançados e anunciados do que na década anterior inteira. O objetivo é claro: abandonar a posição passiva de consumidor e tornar o Brasil uma referência de game design.
Ninguém sabe o que acontecerá nesse novo cenário, mas eu aposto que a criatividade, a inovação e o amor pelos jogos de tabuleiro não serão deixados de lado.